domingo, 15 de abril de 2012

O herói




Tarde chuvosa, os barquinhos passavam pequenos, sem importância. Olhos pequenos melindravam a cena, mas não viam destaque, não viam emoção na ação nervosa, em geral, dos comandantes desses barquinhos. Os olhinhos se apertavam para ver magia. Não tinha nada de real, tudo parecia um truque da TV. Alguém estava a produzir um filme nessa chuva? Se esforçara mais, querendo ver mais por detrás da mesmíssima cor pálida do dia e barrosa das águas que subiam.
– Isso é legal, mamãe? Olha mamãe?!
– Saia da janela!
– Não posso. Fora os barquinhos mamãe, só vejo um homem pintado de preto. Queria ver mais; queria ver o que ele vai fazer com aquele barquinho.
– Como assim: homem pintado? Nessa chuva? Devem ser os lunáticos da Globo – fazem tudo por uma colocação.
 E na visão daqueles olhos, só uma coisa chamava a atenção: homem pintado de negro salvando vidas. Levava as pessoas ilhadas de um lado a outro com seu barquinho. Rua acima, rua abaixo, o homem ia e vinha sem estrelismos e bandeiras. O herói de seu tempo.
– Mãe, posso ser negro?


Shannya Lacerda
Natal, 15 de abril de 2012.

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